Durante
a Era anterior à contagem dos anos, Éneghor, o jovem príncipe de Valafar, vivia
angustiado. Ele sentia que lhe faltava algo, que ainda não estava completo. Em
sua vida faltava o Encanto. Não era o encanto das fadas, nem a magia dos
feiticeiros e dos magos. Era, definitivamente, algo mais poderoso.
O
senhor do reino de Valafar, o rei Ebénethor, sentia que seus dias estavam
chegando ao fim e chamou seu filho Éneghor à sua presença, no salão principal
da fortaleza de Juugher, capital do reino, a fim de prepará-lo para a assunção
ao Trono:
-
Éneghor, filho de Ébenethor, O Sábio! Ouça o que digo: Estou vivendo o fim de
meus dias! Logo me encontrarei com nossos antepassados no Outro Lado, mas antes
disso acontecer, tenho de lhe incumbir uma importante, porém simples tarefa!
Você deve subir ao Trono e receber minha benção, como roga a tradição.
-
Pai! – respondeu o príncipe – Sabes que seria uma grande honra para mim aceitar
tal responsabilidade. E somente meu coração sabe o quanto a quero; mas também é
somente meu coração que sabe a dor que me aflige. Como poderia um rei governar
não estando em paz consigo mesmo? Não te ofendas, Ébenethor, O Sábio, herdeiro
da casa de Anturiel, O Bravo. Tenho que cumprir minha Demanda antes de minha
assunção ao trono. Suplico que permita que eu parta por todo o reino de Valafar
e além dele, se necessário, para que eu alcance meu objetivo.
-
E qual é seu objetivo, Éneghor, último descendente de Anturiel?
O
príncipe prontamente responde, decidido:
-
Encontrar o que não está escondido. Decifrar o indecifrável. Ver o invisível.
Cheirar o inodoro. Ouvir o inaudível. Andar sobre as águas. Cavalgar pelos
ares. Meu objetivo ainda é um tanto obscuro em minha mente, mas meu coração me
guiará, certamente. Ele é como um pergaminho que nunca li: entenderei com a
leitura, com a experiência. Peço que me deixe partir!
Fazendo
valer o seu título, Ebénethor pondera longamente sobre a partida de seu único
filho rumo ao desconhecido. Após um prolongado silêncio, diz:
-
Enfim, vejo que não me haverá alternativa senão permitir que parta. Entretanto,
não temos muito tempo. Sou um homem velho e meu tempo logo se extinguirá. A
busca da sua Demanda deverá durar no máximo um ano. Mandarei os faunos, meus
arautos, os batedores mais rápidos do reino, para anunciar em toda Valafar
sobre a partida de meu unigênito. Em quinze dias sua jornada deverá ter início,
mas até lá prepare seu corpo e seu espírito. Desafios virão e mesmo que seu
corpo resista, sua mente deverá se manter sempre firme e seu espírito inabalável.
-
Nunca conseguirei agradecê-lo por isso, meu Pai! - disse Éneghor abraçando
subitamente o rei em seu trono e beijando-lhe a face.
-
Lembre-se, filho amado: Apenas um ano é o que me resta, segundo o Oráculo de
Juugher! Se ultrapassar esse prazo, qualquer um dos Lordes Feudais poderá
reivindicar o Trono de Valafar.
Com
um fogo jamais visto no olhar do príncipe, este respondeu:
-
Empenharei todas as minhas forças nesta Demanda!
E
virou-se para fazer os preparativos para sua jornada.
Por
quatorze dias os cem emissários do rei percorreram toda a extensão do reino,
enquanto Éneghor treinava incessantemente. Ao fim do décimo quarto dia, o
príncipe foi ter com o Rei:
-
Meu senhor! Devo partir antes da aurora. O vento do crepúsculo me trouxe maus
presságios! Sinto que devo partir o quanto antes. Meu coração está inquieto.
-
Então apronte tudo filho! – respondeu o Rei – E saia pelos portões do sul, onde
a sombra da Floresta das Trevas lhe protegerá até o vale do Grande Rio. Deixarei
ordens aos guardas do portão para que não lhe impeçam ou indaguem nada.
-
Tenho um último pedido a fazer antes da minha partida, grande rei! Dê-me tua
benção e unge minha fronte com teu sangue.
O
Rei Ebénethor levantou-se imponente de seu trono, empunhou a Romper da Aurora,
a Espada Real e, tal qual Arthur, empunhando a Excalibur, consagrou Lancelot
como seu cavaleiro, brandiu-a sobre a cabeça de Éneghor dizendo solenemente:
-
Eis aqui Éneghor, O Andarilho! Eu, Ebénethor, O Sábio, Rei de Valafar, descendente
de Anturiel, O Bravo, lhe consagro Cavaleiro Maior da casa de Anturiel. Batize
agora sua espada!
Oferecendo
sua espada ao rei, O Andarilho proclama:
-
Eis minha espada: Aurora Eterna! Que ela sirva à casa de Anturiel!
Dito
isso, despediu-se do pai, e recolheu-se em seus aposentos.
Antes dos
primeiros raios de sol, O Andarilho já cavalgava silencioso rumo ao portão Sul
de Juugher. Ao se aproximar gritou, sem reduzir a velocidade:
- Anturiel! Anturiel!
E os guardas
rapidamente abriram o portão e o fecharam após a passagem do jovem príncipe.
Éneghor, O
Andarilho, percorreu todo o reino de Valafar em meio ano. Nesse período
aprendeu a bela língua élfica, herbalismo e preparo de poções básicas e
intermediárias, fez amigos de diversas raças: anões, elfos, humanos e até
gigantes. Mas encontrou muitas dificuldades impostas pelos senhores das
províncias onde passou. A maioria deles ficou sabendo de sua jornada através
dos arautos. E logo trataram de tramar contra a vida do Príncipe Andarilho.
Mas graças
aos presentes ganhados nos lugares em que passou, como uma cota de mithrill
feita por mãos de anões, um escudo forjado pelos gigantes de Beira-mar e às
cordas élficas tecidas na Cidade Oculta da Floresta das Trevas, e a sua força
de vontade, Éneghor conseguiu vencer seus empecilhos.
Com o início
do sétimo mês, ao passar sob a sombra das Montanhas Escuras, o príncipe foi
encurralado contra a encosta do Pico Vermelho, a montanha mais alta da
cordilheira, por um grupo de orcs do deserto. Grande parte do grupo caiu
durante o embate e o restante fugiu. Mas o Príncipe fora atingido por uma adaga
envenenada.
Movido pelo
desejo de findar sua Demanda, O Andarilho ainda se pôs sobre o cavalo e se
prendeu ao equipamento de montaria. Sob um comando o cavalo retornou à Vingard,
o último vilarejo que passara, onde foi recebido por um hobbit que morava ali e
fizera amizade dias antes. Lá recebeu comida e bebida, cuidados e repouso.
Três meses foi
o tempo necessário para Éneghor se recuperar. Nesse meio-tempo, havia perdido
as esperanças de terminar sua jornada por Valafar. Assim que estava totalmente
recuperado, decidiu voltar à capital do reino, desejando nunca ter partido.
Chamou o Senhor Barrafim, o hobbit que o hospedara, para ter uma conversa:
- Senhor
Barrafim, sou grato por sua hospitalidade e cuidados. Mas, temo que deva voltar
logo à casa de meu pai. Seus dias são escassos e tenho uma promessa a cumprir.
Mas fique sabendo: a casa de Anturiel sempre será grata a você e sua vila.
Assim que meu reinado tiver início, Vingard será promovida a Primeira Instância
de Valafar. Adeus, meu velho!
- Adeus,
jovem príncipe – respondeu o anfitrião – e que a nossa amizade perdure por
longos anos!
- E que assim
seja! – respondeu O Andarilho dando as costas.
Ao sair,
deparou-se com um bardo que cantava uma canção triste, que contava a história
de uma mulher da linhagem das estrelas que havia sido aprisionada pelo Senhor
das Planícies do Medo, do outro lado das montanhas Sombrias e que lá era
mantida apenas para o deleite do tirano Mordock.
Imediatamente
o coração do príncipe se encheu de esperança e receio. Após o fim da canção,
interrogou o bardo:
- Saudações,
amigo! Diga-me rápido, pois tenho pressa em minha Demanda! Essa história que tu
cantas é verdadeira ou devaneios da imaginação de um vivente?
- Ora, ora,
jovem cavaleiro! – retrucou o bardo - É educado que se apresente, antes de tudo
e qualquer coisa. Pois bem! Não responderei coisa alguma, a não ser que me
mostre ser um homem de valor!
Rapidamente,
o príncipe replicou:
- Sou
Éneghor, O Andarilho! Sou filho de Ebénethor, O Sábio, rei desta terra onde
pisa e de tudo que vai até além de onde a vista alcança! E se estas palavras
não foram suficientes para provar o meu valor, que este seja provado pela minha
espada, a Aurora Eterna!
De imediato o
bardo prostra-se de joelhos, com a face colada ao chão, dizendo:
- Mil perdoes
Alteza! Este pobre estrangeiro não sabia que falava com pessoa de tamanha
nobreza. Diga-me em que lhe posso ser útil.
- Já fiz minha
pergunta e não vou repeti-la! – disse o príncipe irritado.
- Oh, sim!
Mais uma vez, me perdoe! – tremeu o menestrel – Onde eu estava com a cabeça!?
Céus! Deve ser a idade que avança... Sim! Minha canção! É verdadeira, sim
senhor! Eu mesmo já vi o brilho da Estrela Matutina e provei do encanto que
provém dela. Mas não tome as Planícies do Medo como caminho. Aquele lugar é
maldito!
- Que seja
maldito mil vezes! – disse Éneghor brandindo a Aurora Eterna num brilho azul – Jamais
esqueça esse momento, viajante! Em breve cantará a história do Andarilho por
toda a Terra. Vá agora à casa de meu pai e diga que seu filho ainda vive e que
em breve estará terminada a minha Demanda.
E partiu
imediatamente à cavalo rumo às planícies do Medo. E na direção contrária,
partiu Jintoorn, o Bardo, em direção à Juugher, onde mais tarde seria nomeado
Porta-Voz do rei Éneghor.
Incansável, O
Andarilho contornou as Montanhas Escuras para chegar às Planícies do Medo.
Toda a
aventura d’O Andarilho nas Planícies do Medo é narrada em ÉNEGHOR CONTRA O
TIRANO DO MEDO.
Enfim, Éneghor
salvou Elend, a filha da primeira estrela da noite, a primeira estrela cadente
de todas as Eras.
O Andarilho
levou Elend dentro do prazo estipulado por Ebénethor, O Sábio, Senhor das
terras de Valafar, cumprindo, assim, sua Demanda. Elend ficou conhecida como A
Estrela de Valafar. O reinado de Éneghor foi longo e prodigioso. Após sua
assunção, o Rei Éneghor rebatizou sua espada, chamando-a Estrela-guia, e construiu
o Templo da Estrela de Valafar, onde sua esposa Elend deu a luz a três
constelações. Em seguida, puniu os Senhores das Províncias do reino que
atentaram contra sua vida e entregou as Províncias a homens, anões, elfos e gigantes
valorosos que conheceu durante sua jornada. Cumpriu a promessa feita a
Barrafim, o Hobbit e nomeou Jintoorn, o Bardo, Porta-Voz de Valafar.